Valorização
da diversidade e educação em organizações do século XXI
Reinaldo Bulgarelli
Txai Consultoria e Educação
23 de fevereiro de 2011
Um mundo com tantos desafios necessita de profissionais cada
vez mais atentos às possibilidades que a conexão e a vida em rede possibilitam.
É a colaboração em espaços virtuais ou presenciais que permite ampliar o
conhecimento, criar e inovar na direção de um mundo mais sustentável.
A construção urgente de um mundo mais sustentável traz
consigo o desafio de criarmos espaços criativos e inovadores para nossos
negócios. A empresa não sobreviverá sem uma boa dose de ousadia em termos de
inovação tecnológica e também cultural. Como estamos realizando ou vivenciando
mudanças no nosso comportamento frente a esses desafios colocados por um mundo com
7 bilhões de pessoas e em evidente colapso? Como foi ser feliz nos anos 2000 e
como serão nossos padrões de felicidade nos próximos anos?
Nem precisamos ir muito longe neste exercício porque é agora
que precisamos encontrar soluções para que nossos produtos e serviços façam
sentido para as pessoas, demonstrando compromisso com a vida e com sua
felicidade. Quem irá encontrar essas soluções?
A melhor universidade do mundo não consegue sozinha formar
uma pessoa para trabalhar na empresa que está na mira da agenda de
sustentabilidade. A qualquer momento, seu produto e até mesmo sua existência
podem ser questionados. Será mesmo que precisamos disso ou será mesmo que essa
empresa fará falta?
De qual empresa estamos falando? De todas. A ideia de cadeia
de valor e necessidade de realizar a atividade empresarial considerando muitos
stakeholders ou públicos estratégicos envolve a todos numa rede de relações
complexa e dinâmica, interdependente, orgânica, assim como é complexa e
dinâmica a sociedade onde as empresas operaram. Nesta rede de relações há os
olhos bem atentos de um consumidor que está mais rapidamente acolhendo o
convite para repensar seus valores, sua maneira de consumir e de buscar
felicidade.
Mais do que medir a velocidade desta mudança, é importante
perceber uma tendência e reconhecer que a mudança é mais rápida do que a
capacidade das empresas de dar conta dela. A produção de soluções tecnológicas
que causem menos dano ao planeta e que acompanhem as mudanças de perspectiva,
interesses, valores e de felicidade das pessoas que compram o que vendemos
esbarra no conservadorismo de estruturas rígidas e processos que existem para
congelar a empresa no tempo e não para fazer rodar pelas estradas de um mundo
onde a mudança mudou, é intensa, profunda e ligeira. Até mesmo a definição da
identidade da empresa parece mais um cativeiro, uma “identidade paralisante” do
que um eixo em torno do qual os sujeitos da empresa podem ousar na interação
com a realidade atual e futura.
Uma empresa hoje, mais que nunca, é feita de diferentes
perspectivas unidas, articuladas e trabalhando juntas, não sem conflitos, tendo
por base uma identidade organizacional sintonizada com o presente da humanidade
e com seus anseios de uma vida melhor, digna, para todos em todos os lugares. Como
encontrar a melhor forma de traduzir qualidade, preço e entrega em algo
realmente sustentável para todos e não apenas para uma parte da cadeia de
valor?
Diálogo,
capacidade de incluir perspectivas variadas na tomada de decisões, de colaborar
na diversidade de pensamentos, histórias de vida e de características humanas
das mais variadas, parece ser uma resposta útil neste momento em que tendemos a
acreditar mais e mais no individualismo ao invés de acreditarmos no indivíduo.
O que nos atrapalha? Gostamos de grifes nos diplomas, mais do
que do conhecimento e de pessoas estudiosas. Gostamos de reunir times que falem
muitas línguas, mesmo que nem sempre seja a língua do nosso tempo e lugar.
Gostamos das aparências e dos seus significados, mais do que dos conteúdos,
suas potencialidades e possibilidades. Gostar de aparências eleitas como
normais, chiques, poderosas, confiáveis, nos leva a estereótipos, preconceitos
e práticas de discriminação, quando precisamos é de abertura para enxergar o
que está diante de nós. Gostamos de harmonia, mesmo que seja falsa, porque ela
dá ideia de “ordem e progresso”, mesmo que transforme nossas empresas em um
verdadeiro cemitério da criatividade humana.
Não é tarefa fácil encontrar meios de trabalhar juntos,
colaborar e contribuir para o todo em estruturas rígidas, autoritárias, conservadoras,
elitistas e avessas à diversidade. A diversidade que queremos muitas vezes
passa por levíssimos e harmônicos tons de azul e não por um arco-íris cheio de
cores contrastantes e conflituosas. Queremos uma diversidade que esteja sob o
controle dos nossos processos, que não tenha nenhuma característica divergente
do conjunto, da maioria, do padrão dominante. Queremos aprender na diversidade,
mas desde que não nos custe conviver com mulheres, onde há apenas homens, com
negros, onde há apenas brancos ou com pessoas com deficiência, onde há apenas
pessoas sem deficiência. E por aí vai.
Não se trata de um
vale-tudo, pois há a identidade organizacional com sua missão, visão e valores
definidos. Mas, como foi dito, ela nem sempre é fonte de energia para nos
transportar a novos lugares e parece mais uma âncora que nos prende ao passado.
Gestão como sinônimo de controle precisa ser conceito resignificado
porque há muito mais asfixia do que criação de possibilidades para fazer e
incrementar, inovar, criar e recriar constantemente num mundo que se cria e
recria mais rapidamente ainda.
Quem será o convidado para o mundo sustentável que precisamos
construir agora? Do sonho de quem ele será feito? Quem será ouvido? Quem
participará de sua construção? Seremos inclusivos na hora do sufoco ou jamais
seremos nada. Bom seria ser inclusivo sempre, mas se pelo menos neste momento
pudéssemos alargar nossos horizontes, as soluções seriam de melhor qualidade.
Diversidade e sustentabilidade andam juntas e uma é parte integrante da outra.
Não há sustentabilidade sem valorização da diversidade, o que
significa gostar, ter apreço, considerar e reconhecer a diversidade que nos
caracteriza a todos como fonte potencial de adição de riqueza a todos. Não há
porque afirmarmos nossas características ou marcadores identitários se não for para
cooperarmos melhor nessa construção da sustentabilidade que precisa ser
coletiva e intensamente vivida no encontro, no diálogo, na abertura ao novo, ao
diferente de si, do padrão dominante, do esperado e da rotina forjada por
práticas controladoras e autoritárias. O inusitado, o inesperado e a surpresa
dependem da pessoa para serem percebidos e transformados em algo interessante
para si e para o todo.
No mundo do triple bottom line, que desconstrói a lógica do
lucro por si só e para si mesmo, a diversidade é muitas vezes esquecidas. É
como se ao falar de pessoas, planeta e lucro não estivéssemos falando também de
cultura, de política e de economia, de filosofia e de visões de mundo que
interagem para compor a realidade e os padrões de felicidade. Há quem traduza
lucro (profit) por economia no modelo
criado por John Elkington em seu livro “Canibais de Garfo e Faca”, de 1999.
Economia não envolve pessoas e o planeta? Não envolve aspectos culturais e
políticos? Onde há pessoas, há cultura. A dimensão cultural é parte da essência
da humanidade nesta eterna construção de nós mesmos e das maneiras de vivermos
juntos no planeta e até fora dele. A diversidade humana está na essência de uma
gestão sustentável que trabalha para o desenvolvimento sustentável.
Porque esquecemos este pequeno detalhe? Porque tudo em volta
conspira para isso com anos e anos de desprezo pelo que não é liso, homogêneo,
regular, normal... E ser normal é caber nas medidas do Homem Vitruviano, de
Leonardo da Vince. Tudo que não é homem, com medidas simétricas, branco e
adulto, foge da norma de perfeição comprada por nossa mente como atributo de
beleza, confiabilidade, harmonia, paz, sucesso e felicidade.
A diversidade que queremos tem vida, não é insípida, inodora,
incolor, invisível, intátil, insonora, insopesável, imperceptível, sem nada que
atrapalhe a paz do Homem Vitruviano. A diversidade que queremos é inclusiva
porque se identifica com a pluralidade humana que nos caracteriza a todos e
assim deveria estar presente em nossas organizações, espaços onde reunimos
gente e não “mão de obra”.
Diversidade é uma palavrinha relegada ao campo da cultura e
pouco utilizada nas discussões sobre sustentabilidade. No entanto, sem a
dimensão cultural, não há triple bottom line que sobreviva.
*Revisto em 09 de agosto de 2015.