E a minha São Paulo amanhecerá aniversariando. 460 anos!
Este casarão na esquina da minha casa já não existe mais. Construíram um prédio
imenso na esquina. Imenso, feio e caro, mas é assim que a cidade vai juntando
gente, apartando gente, criando modas, acolhendo sonhos.
Duvido que haja uma
cidade no Brasil que reúna tanta gente de diferentes lugares que para cá vieram
carregando seus sonhos. Talvez por isso somos tão individualistas com nossos
sonhos nos bolsos, prontos para brigar com quem os ameace. Talvez por isso, ao
mesmo tempo, somos tão criativos, terra de artistas do concreto, seja nos
palcos ou num escritório qualquer da avenida Paulista.
A rua Augusta era assim,
quando eu nasci em 1961. Decerto eu subi essa ladeira para ir da maternidade
para casa, na esquina da rua 25 de março com a Carlos de Souza Nazaré. Hoje
moro na Augusta, de onde vejo umbigos tatuados, essa mistura de sonhos individualistas
e criativos, esperando um motivo qualquer para sair em passeata, para fazer
voluntariado, para cuidar do lixo, para se organizar nos prédios e na rua e nos
bairros e no repensar a cidade. Bom seria que amanhã, no aniversário, todos
pensassem juntos como melhorar a vida e a vida na cidade, o umbigo e a
tatuagem, reunindo tudo numa reinvenção permanente para darmos conta desses
imensos desafios.
Outro dia morreu um menino de 16 anos aqui perto. Dizem que
foi suicídio, mas tantos outros foram mortos por gente intolerante que não dá
pra acreditar nas autoridades policiais. Outro dia nasceu uma menina aqui
perto. Anônima, ela é a mais famosa em seu círculo familiar e de amigos. O que
ela será daqui a trinta, quarenta anos? Como estará nossa cidade? O que teremos
feito de nossas vidas e de nossa cidade?
Reinaldo Bulgarelli, 24 de janeiro de 2014