Dei entrevista ao jornalista Gilberto Scofield Jr falando sobre a Câmara Brasileira de Negócios GLS, o temor das empresas em associar a marca à comunidade LGBT e a primeira feira de negócios a ser realizada em 2011, em São Paulo. Segue matéria que foi publicada no O Globo.
Em julho de 2011, a cidade de São Paulo vai sediar o primeiro Expo Business LGBT do Mercosul, uma feira de negócios que pretende reunir cerca de 30 empresas com atividades direta ou indiretamente voltadas para o público de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT) da região. Empresas de turismo, hotelaria, gastronomia, aluguel de carros e lazer de um modo geral são as mais interessadas, mas o encontro estará aberto para qualquer tipo de empresa ou profissional liberal que queira aproveitar a ocasião para conversar sobre as oportunidades geradas por um público estimado em 18 milhões de pessoas no Brasil e com um poder de consumo que muitos calculam ultrapassar os R$ 150 bilhões.
Trata-se do primeiro grande evento da Câmara de Comércio GLS do Brasil, cujo estatuto foi aprovado há um ano e as atividades começaram a se estruturar de fato recentemente. A Câmara, que hoje possui 40 associados - a maioria pequenos negócios voltados para a comunidade - e três grandes empresas como observadores - os bancos Itaú e Santander e a construtora Tecnisa -, tem o apoio institucional da Coordenadoria de Assuntos da Diversidade Sexual da prefeitura de São Paulo e se reúne mensalmente para estudar ações que fortaleçam os negócios do grupo.
O slogan é curioso: "Vamos tirar o mercado do armário!".
“Enquanto no exterior as empresas possuem ações específicas voltadas ao público LGBT, a exemplo da Fiat, que bancou a passeata gay em Madri, impressiona que no Brasil elas ajam como se a comunidade gay não existisse. É preconceito não apenas nas empresas, mas nas agências de publicidade”, diz Douglas Drumond, presidente da Câmara e proprietário do Clube 269 em São Paulo, e do hotel Ouro Minas, em Belo Horizonte.
“Há muito preconceito, conservadorismo e pouca objetividade nas grandes empresas”, faz coro o coordenador da área de Sustentabilidade e Gestão Ambiental da FGV e professor da Unicamp, Reinaldo Bulgarelli, cuja consultoria Txai é especializada em políticas de diversidade e sustentabilidade no mundo corporativo e ajudou a montar a Câmara.
Empresas ainda temem associar marcas a gays
O coordenador da área de Sustentabilidade e Gestão Ambiental da Fundação Getulio Vargas (FGV) e professor da Unicamp, Reinaldo Bulgarelli, afirma que o preconceito existente nas empresas com relação à associação de suas marcas e atividades a grupos de gays e lésbicas varia de país para país.
Ele lembra ainda que não há provas de que uma marca seja contaminada ao ser associada a grupos homossexuais. "Muitas multinacionais que fazem isso lá fora não reproduzem as ações no Brasil", afirma Bulgarelli.
Não é o caso do banco espanhol Santander, um dos observadores presentes às reuniões da Câmara de Comércio GLS e uma das empresas mais ativas em políticas orientadas a esse público, sejam funcionários ou clientes. Em 2005, por exemplo, o Santander ampliou para casais do mesmo sexo os benefícios de previdência privada, assistência médica e odontológica dados aos funcionários heterossexuais.
Em 2006, o banco criou a primeira carteira de crédito imobiliário para casais de mesmo sexo que querem comprar imóveis. "Participamos da Câmara porque temos uma política interna de valorização da diversidade e atendemos a clientes que são gays e lésbicas. Então é natural que nos associemos a instituições que possam nos abastecer de informações relativas a esses públicos", diz Maria Cristina Carvalho, superintendenteexecutiva de Recursos Humanos do Santander.
Estabelecimentos gays sofrem pressão
Dispostos a fazer o que Douglas Drumond, presidente da Câmara de Comércio GLS do Brasil chama de "trabalho de casa", a câmara encomendou ao Ibope o orçamento de uma pesquisa para levantar as principais estatísticas do chamado mercado de consumo gay, cujas reais dimensões ainda se baseiam mais em estimativas informais que em números confiáveis. O projeto custará R$ 220 mil, recursos que Drumond espera arrecadar de associados e patrocinadores.
"Costumo dizer às empresas que apoiar este levantamento é um tipo de compensação por faturarem com uma comunidade que costuma consumir muito", diz Drumond. "Mas o problema básico continua sendo a garantia de vida dos negócios".
Explique-se: há cerca de um ano, as boates gays paulistas Cantho e A Lôca receberam visitas da Polícia Civil numa ação que, segundo a Secretaria Estadual de Justiça, não passou de vigilância rotineira. Mas, para Drumond, foi uma pressão velada para inibir os negócios, pressão que geralmente parte de associações de moradores que não gostam do público GLS na vizinhança.
Essa ameaça, diz ele, é um pesadelo à sobrevivência dos negócios, mas também a força que empurrou os empresários à aglutinação num grupo que possa responder por todos.
- Veja a matéria diretamente no O Globo: http://oglobo.globo.com/economia/mat/2010/07/31/sao-paulo-vai-sediar-primeira-feira-de-negocios-do-mercosul-voltada-para-publico-gay-estimado-em-18-milhoes-no-brasil-917291102.asp